Não havia arco-íris no céu daquela cidade cinza, o menino ficava resignado a observar objetos que, para ele, guardavam pedaços das cores que se perderam nas cidades grandes. Ele consultava a caixa das luzes toda vez que sentia que era necessário. Certa vez quando sua irmã voltou para casa com olhos roxos tudo estava ficando mais escuro, todo mundo começou a chorar, só restou correr para o quarto, ligar a lâmpada e pegar o primeiro CD para ficar refletindo contra a iluminação caseira, as cores curariam.
Ou como quando ele percebeu que seu melhor amigo não voltaria mais para vê-lo, ligou a primeira torneira e começou a jogar água pro céu ensolarado de uma tarde de fevereiro, cada pingo ia decompondo a luz e a dor. Não era solucionar, era anestesiar.
Crescendo ele descobriria que a vida consistia em longas séries de dores e anestesias em suas mais variadas formas.
Uma pedra de mentira, de plástico transparente, era a mais usada para momentos leves, algum tropeço ou machucado, não gostava de remédios, preferia os seus; certo dia os valores quase se perderam, a caixa foi aberta violentamente, em proporção a dor do momento: sua irmã foi entregue em casa, já sem vida, os mais soturnos tons sujos a roubaram dele, não adiantava, nenhuma cor a traria de volta ou faria a dor passar, a caixa terminou por cair no lixo e quase se perder, não fosse a ajuda de uma senhora que conhecia os hábitos do garoto, e admirava na mesma medida em que sentia pena, ela pegou o objeto e recolheu com carinho, sabendo que o momento exigiria mais do que um punhado de cores.
Era como se tivessem roubado sua visão. Acontece que ao voltar a enxergar o modo de absorver a luz mudara, não precisava mais da caixinha, deu de presente para outra criança, que continuaria o ciclo.